A
organização e o sentido do trabalho precisam ser repensados para que as
metas abusivas e o assédio moral sejam combatidos. A avaliação é do
professor Laerte Idal Sznelwar, do Departamento de Engenharia da
Produção da Escola Politécnica da USP, em entrevista concedida para a
Contraf-CUT. Ele é médico do trabalho, doutor em ergonomia e pós-doutor
em psicodinâmica do trabalho.
A preocupação inicial
demonstrada pelo especialista sobre as condições de trabalho dos
bancários e as questões que envolvem a saúde e segurança teve como foco a
organização do trabalho. Para ele, é preciso pensar nas escolhas feitas
pelos bancos sobre o que é fundamental para o trabalhador. "O bancário
realiza uma atividade repetitiva, com tarefas que não lhe permitem dar
um sentido maior ao seu conteúdo", diz.
Segundo Laerte, o pouco
tempo de maturação que este profissional possui quando ingressa no
serviço bancário é o que dificulta o aprimoramento da atividade e um
maior sentido a função. "Ao entrar no mercado de trabalho, as pessoas
participam de um processo contínuo de aprendizado, o que normalmente não
acontece aos bancários. O que se observa neste setor é um número grande
de trabalhadores na linha de frente e pouco tempo para que desenvolvam
suas habilidades. Essa forma de organização acarreta uma grande
competição entre todos e piora ainda mais o ambiente de trabalho",
ressalta.
Trabalho coletivo
O
professor defende uma participação mais ampla do trabalhador com o
processo de trabalho e maior envolvimento com as tarefas num âmbito
coletivo, priorizando a equipe e não o indivíduo. "A forma como o
trabalho bancário está organizado leva a situações das mais absurdas. Os
trabalhadores são exigidos pelo cumprimento de uma série de atividades,
mas ao mesmo tempo são tarefas esvaziadas. Além disso, o profissional
precisa atuar com um sistema informatizado, muitas vezes com duas ou
três plataformas e, por outro lado, não tem autonomia para acompanhar
todo o processo, o que reduz seu poder de argumentação e decisão",
enfatiza.
Para ele, a falta de conhecimento do bancário com todo o
processo de seu trabalho contribui decisivamente para o aumento das
fraudes. "É um grande paradoxo porque sabemos que problemas desta ordem
acontecem em meio ao silêncio e ao distanciamento técnico da própria
atividade que se realiza. Quanto mais experiências forem trocadas, mais
possibilidades se têm de criar um ambiente saudável e, de fato,
integrado e coletivo", afirma.
Laerte ressalta que a
individualização da atividade é uma das consequências mais trágicas do
neoliberalismo. "Quando se joga tudo para o indivíduo você destrói o
sistema porque nossa força enquanto pessoa é relacionada aos outros.
Conseguimos fazer melhores coisas quando há cooperação", diz.
Metas abusivas
Ele
considera que as metas não levam em conta a realidade e a influência
dos trabalhadores em todo o processo. "O problema das metas está em como
ela é definida. As metas abusivas são impostas de cima para baixo e o
trabalhador que faz o contato com o cliente, que realiza a negociação,
praticamente não é ouvido. A empresa em muitos casos tem uma determinada
estratégia e não considera outras dimensões do trabalho revestidas de
diferentes realidades. Sabemos que quando atingimos a meta, a tendência é
que ela aumente", explica.
Assédio
O
especialista destaca também que o excesso de individualização permite
que o assédio moral e sexual apareça. "É neste tipo de ambiente que se
consegue assediar mais as pessoas. Elas não cooperam, por outro lado
estão sozinhas. E o adoecimento, por sua vez, 'bate a porta' porque a
pessoa está fragilizada. O isolamento, seja no escritório ou em qualquer
outro ambiente, possibilita o assédio das mais diferentes formas",
conclui.
Campanha Nacional dos Bancários
Preocupado
com essa organização do trabalho, o adoecimento e os efeitos na saúde
do trabalhador, o Comando Nacional dos Bancários, coordenado pela
Contraf-CUT, realiza nesta quinta e sexta-feira, dias 8 e 9, a primeira
rodada de negociação com a Fenaban, em São Paulo, focando as demandas
sobre condições de trabalho.
Estarão na mesa o bloco de
reivindicações que envolvem saúde, fim das metas abusivas, combate ao
assédio moral e segurança bancária. "Queremos um emprego saudável e
seguro, onde o bancário seja respeitado e valorizado no trabalho",
salienta Walcir Previtale, secretário de Saúde do Trabalhador da
Contraf-CUT.
Fonte: Contraf-CUT
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